domingo, 3 de junho de 2012

Satyricon, Grupo Delírio Cia De Teatro, 2012










Satyricon Delírio, de Edson Bueno, colocou 34 atores em cena para a adaptação do romance romano que fala de ciúmes e obsessão. 

Edson Bueno em foto de Chico Nogueira

Quando leu a tradução de Paulo Leminski de Satyricon, de Petrônio, há 20 anos, o diretor de teatro Edson Bueno pensou que aquela seria uma bela provocação, capaz de fazer parar e pensar sobre preconceitos e hipocrisias ligadas ao sexo. Acertou, já que Satyricon Delírio causou frisson desde a estreia, durante o Festival de Teatro, e lotou as apresentações no Espaço Cênico, de quinta a domingo. 
A adaptação curitibana do romance romano, datado de 60 d.C., colocou 34 atores em cena quase o tempo todo, tascando olhares sedutores na plateia.
Tudo começa numa movimentada praça do império de César. Em meio aos muitos personagens, surge um triângulo amoroso homossexual em apuros – aliás, rapidamente se percebe que o tempo histórico em questão exige uma readequação de conceitos: o amor e o sexo homossexuais aparecem como algo paralelo ao equivalente heterossexual, e não como uma exceção. 
O trio, formado por En­colpo, Ascilto e Giton, sofre por ciúmes e desconfianças, enquanto encontram em uma viagem seres ainda mais libertinos e vivem aventuras que revelam mais sobre si mesmos.
No segundo ato, chegam à casa de Trimalcião, vivido por Maurício Vogue, espécie de mecenas adorado que facilita a resolução de um conflito íntimo de Encolpo: ele se viu enfraquecido justo no órgão do qual “dependia toda sua glória”, como define seu anfitrião no longa-metragem Satiricon, de Fellini (1969). A segunda escolha do Delírio que pareceu alongar o espetáculo foi por alternar dois momentos de “bacanal” com dois tempos sublimes.
Apesar do vaivém, o contraste deixa o trabalho bastante rico, quando os atores saem e voltam ao palco numa forte mudança de clima. Foi ótima a sacada de incluir nudez somente nas etapas mais delicadas, em que as luzes são diminuídas e as palavras dão lugar a uma coreografia sutil, mas poderosa.
Os movimentos, fruto de muita pesquisa do grupo, falam da criação do mundo e do surgimento do homem em meio aos deuses que o manipulam. Certamente, não se trata de um trabalho fácil, apesar do ilusório verniz de “peça de sacanagem”.
Entrevista com Edson Bueno, diretor do Grupo Delírio
“O caos tem de estar presente”
Como foi a reação do público à peça?
Passados os primeiros dias de choque cultural, lotou todos os dias. 90% do público achou o maior barato, uma ousadia. Recebo muitos e-mails e pessoas me adicionam no Facebook para dizer o que acharam. E divulgam.
Quem você tinha em mente como público?
Imaginava adolescentes de até 30 anos, mas 70% do público tem até 35 anos. Com o tempo, o público que veio é mais intelectualizado e afinado.
Como foi preparar tantos atores?
Foram 34 atores em cena. Todos com alguma experiência, de diferentes escolas – Cena Hum, Lala Schneider, Pé no Palco. O grande barato é que isso trouxe todo tipo de prática teatral, mas, mesmo assim, consegui dar uma linguagem clara. Teve uma homogeneidade mantendo o heterogêneo. Também não quis que todo mundo ficasse igual – o caos tem de estar presente.
Eles deram conta do recado?
O que me deixa satisfeito é que todo mundo acaba feliz. Todos emagreceram muito, teve gente que perdeu seis quilos. Vi a “involução” do elenco, que mostra o quanto a peça exige fisicamente, e que eles não se economizam.
Você suprimiu partes ou expandiu o teor erótico do livro?
O livro é mais nojento até, mais desagradável, tem coisas bem grotescas e grosseiras. Ele renderia uma peça de 12 horas recheado do que há de mais… O que a gente fez foi não esconder.
O objetivo era provocar?
Quando li o livro, achei uma grande provocação. Sabia que faria parar e pensar de maneira radical. E mesmo no Império Romano foi, senão, não teriam obrigado o autor a se suicidar. E isso numa época em que alguns aspectos morais eram muito mais livres do que hoje.



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