terça-feira, 8 de maio de 2012

Pasolini, O Ator E O Leão.


É delicioso falar. Entregar ao ator um texto para ser decorado, transformado em matéria orgânica e vivido pelo gesto do teatro, é mais que um presente, é um desafio de loucura! Atores se sentem seguros falando, mas em muitos casos não percebem que de suas palavras, por melhores que sejam ditas ou vividas no palco, pouco ou quase nada vai ficar guardado na memória do público. Palavras são reflexos da alma e o que deve estar no palco é a alma. Essa, sim, acompanha o público para além do teatro. Então, o que são as palavras? A quem interessa, por exemplo, o “ser ou não ser”, de Hamlet/Shakespeare? Posso estar enganado, mas acredito que o texto no teatro só interessa ao ator. Ao público não interessa o que o ator fala, interessa sim o que ele é no palco. E esse é o desafio. Se você quer falar de liberdade, ao invés de discursar sobre ela no teatro, seja ali, diante do público, livre! E nada haverá de mais profundo e sincero. Pier Paolo Pasolini era uma dessas personalidades raras, um artista/intelectual/pensador que vivia o presente com intensidade. Seu cinema é original na medida em que reflete uma ideia viva e não um sonho ou uma memória. Pasolini queria viver uma nova sociedade e como seu Jesus de “O Evangelho Segundo São Mateus” saía vociferando contra os “vendilhões do templo”! Então, como usar as palavras e imagens de Pasolini para revivê-lo no palco e ser tão contemporâneo, necessário e radical, em 2012, como ele foi a seu tempo? Que desafio é esse? Penso que não é preciso construí-lo aos moldes clássicos, pelos caminhos de Stanislavski, mas compreendendo a sua importância como revolucionário. É preciso ser provocador e ter o desejo de tirar o público de seu conforto, de sua omissão tolerante. É preciso colocar o público dentro da jaula do leão, com o leão e sem chicote ou cadeirinha. Mais ainda, sem qualquer manual de informações de como lidar com a fera selvagem. O ator é o leão, que pode até abdicar de sua condição de natureza e permitir-se domesticar. Mas existem outras possibilidades...
“O teatro só poderá voltar a ser ele mesmo, isto é, voltar a constituir um meio de ilusão verdadeira, se fornecer ao espectador verdadeiros precipitados de sonhos, em que seu gosto pelo crime, suas obsessões eróticas, sua selvageria, seus desejos, seu sentido utópico da vida e das coisas, seu canibalismo mesmo se expandam, num plano não suposto e ilusório, mas interior.”- Antonin Artaud

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